quinta-feira, 24 de maio de 2007

ReCriAd - Crianças e Adolescentes em Rede.

O ReCriAd é um sistema de informação que integra todos os Programas e Projetos de Atenção e de Proteção à criança e ao adolescente e seus órgãos gestores, visando a garantia dos direitos da infância e juventude no Município de São Carlos.

O ReCriAd surgiu da parceria entre a Prefeitura Municipal de São Carlos com o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES. O investimento em recursos não reembolsáveis na ordem de R$3 mi pelo BNDES no município de São Carlos para a construção de 02 centros da juventude previa ainda a construção de um sistema que integrasse as diversas entidades que lidam com a criança e adolescente. Concomitantemente a isso, a Prefeitura de São Carlos conseguiu mais recursos para este fim em um concurso de projetos proposto pela Fundação Telefônica. Esta por sua vez propôs que o desenvolvimento desse sistema fosse realizado através de um consórcio entre os municípios que tiveram seus projetos aprovados no concurso. Assim o software está sendo desenvolvido com recursos de oito municípios são eles: São Carlos, Diadema, Várzea Paulista, Araçatuba, Guarujá, Mogi das Cruzes, Bebedouro e Itapecerica da Serra.

O papel de São Carlos na Fundação Telefônica e no BNDES foi fundamental para que estas entidades passassem exigir que o produto final para financiamento de projetos dessa natureza, fosse um Software Livre.

A Prefeitura Municipal de São Carlos em janeiro de 2005, visando uma melhoria na atenção à criança e adolescente, a criou a Secretaria Especial da Infância e Juventude, cujos objetivos são de elaborar e executar programas de amparo à criança e ao adolescente, organizar a política de apoio à integração do adolescente no mercado de trabalho, prestar assessoria ao Prefeito nas políticas de inclusão social da criança e do adolescente, coordenando a atuação das demais secretarias municipais e articulando iniciativas públicas e privadas de proteção social à infância e juventude. É responsável pela implantação, coordenação e atuação dos Centros da Juventude, além de também apoiar o funcionamento dos Conselhos Municipais relacionados ao setor.

A ação da Secretaria envolve a coordenação e articulação de diversos segmentos. Entre eles encontramos:

- Creches municipais e conveniadas;

- Entidades de complementação escolar e profissionalizante;

- Conselhos municipais (Tutelar e CMDCA – Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente);

- Vara da Infância e Juventude, Ministério Publico com a Promotoria da Justiça da Infância e Juventude, Segurança Pública (Polícias Militar e Civil);

- Demais Secretarias Municipais (Cidadania e Assistência Social, Educação e Cultura, Esporte e Lazer e Saúde);

- Além de diversos projetos especiais cujo maior destaque é o NAI – Núcleo de Atendimento Integrado. Criado como uma proposta alternativa à construção de mais unidades de internação da Febem. Os conhecidos complexos, além de tirar os adolescentes das próprias cidades, têm funcionado como verdadeiras unidades prisionais, onde as regras que regem as relações entre os adolescentes e, muitas vezes, até mesmo destes com os educadores, são pautadas pelo código que a criminalidade plantou nas cadeias e presídios. O Núcleo não substitui a internação, mas com sua ação preventiva reduz, e muito, o número de adolescentes encaminhados à Febem.

A Secretaria enquanto elo das diversas entidades necessita trabalhar com informações precisas e eficientes para coordenar seu trabalho.

Atualmente cada entidade realiza o seu próprio cadastro do jovem das mais distintas maneiras possíveis. Sejam elas no papel ou até sistemas informatizados, porém ainda continuam sem a integração da informação. Toda vez que é necessário algum tipo de informação consolidada sobre um jovem, é necessário promover a realização de pesquisas em todas as entidades que ele possa ter passado, fato que torna esse tipo de busca muito onerosa e pouco eficiente. Além do fato de que inviabiliza a extração de relatórios quantitativos e qualitativos das ações de todas as entidades bem como suas abrangências.

A espacialização territorial das informações e ocorrências relativas às crianças e adolescentes permite com que os gestores públicos possam dimensionar e direcionar com melhor eficiência as ações do poder público bem como os seus recursos. A criação de indicadores apoiados em séries históricas faz com que, na medida em que o sistema evolui e a base de dados cresce, as análises extraídas dele sejam cada vez mais precisas e ricas em detalhes.

Uma das primeiras ações da Secretaria foi demandar ao Departamento de Tecnologia da Informação – TI um sistema que fosse capaz de gerenciar todo este complexo descrito acima. Desde então o setor de desenvolvimento de TI começou a levantar os requisitos, conhecer as especificidades de cada uma das entidades e propor um modelo capaz de solucionar todo o problema. Porém, como o Departamento conta com uma equipe de desenvolvimento reduzida, fato que foi exposto ao Secretário da época e aconselhado uma contratação do desenvolvimento de terceiros a partir do modelo proposto.

A Secretaria Especial de Infância e Juventude, ciente que deveria angariar recursos orçamentários para a confecção do sistema, elaborou alguns projetos solicitando verbas a órgãos financiadores para o seu desenvolvimento. Assim quando o Município conseguiu junto ao BNDES um financiamento na ordem de R$3 mi em recursos não reembolsáveis para a construção de dois centros da juventude, no projeto foi previsto o desenvolvimento de um sistema que controlasse e agregasse as informações das diversas entidades em uma base de dados única, bem como a aquisição de equipamentos de informática para os centros. Aliado a este fato, a equipe da Secretaria juntamente com o Departamento de TI elaborou um projeto para a apreciação da Fundação Telefônica solicitando mais recursos para o desenvolvimento e aparelhamento de todas as entidades. O projeto de São Carlos foi um dos selecionado dentre os demais e assim com o novo apoio o sistema ganhou maior status.

A Fundação Telefônica, com uma atitude bastante responsável, sugeriu que os municípios que foram selecionados na convocatória formassem um consórcio para a elaboração do sistema. Uma vez que ela identificou que todos os municípios possuíam necessidades semelhantes, o núcleo do sistema poderia ser o mesmo e somente seria necessário novos desenvolvimentos para funcionalidades específicas de cada município ou customizações para atender algumas entidades que possuam algum controle diferenciado. Os municípios de São Carlos, Diadema, Várzea Paulista, Araçatuba, Guarujá, Mogi das Cruzes, Bebedouro e Itapecerica da Serra, concordaram na participação do consórcio.

Reuniões periódicas com os responsáveis pelas áreas de infância e juventude de cada um dos municípios bem como a equipe de TI começaram a ser realizadas para a definição tecnológica e alinhamento e unificação dos requisitos do sistema. A própria Fundação Telefônica se encarregou de contratar a equipe de desenvolvimento de software, fato que possibilitou a modalidade do consórcio, uma vez que se todos os municípios fizessem licitações separadas para contratação do desenvolvimento, a unificação se tornaria inviável.

A solução encontrada foi segmentar a informação ao máximo possível para que cada entidade tenha acesso apenas às suas informações e às informações gerais, ao mesmo tempo que mecanismos de segurança, log e termo de responsabilidade assinado por cada usuário garantem a integridade dos dados da criança e do adolescente, para que todos compartilhem entre sim, minimizando esforço em cadastros e recadastros, facilitando acesso a relatórios de assistentes sociais, dos quais muitas entidades fazem uso para priorizar atendimentos, de forma a atender aquelas crianças/adolescentes mais vulneráveis socialmente.

O software é único na questão da união de oito municípios que integram seus esforços com pessoal e financeiros para a obtenção de sistema que seja um denominador comum, modulável, capaz de conter o núcleo central comum a todos e ainda manter a capacidade de se adequar às necessidades específicas de cada cidade em termos de organização e relacionamento entidade-entidade. A segurança promovida pela discussão neste grupo traz à cada cidade rico amadurecimento das questões pertinentes ao domínio da informática. O processo para tal elaboração é a participação de técnicos com diversos profissionais da área social e saúde, de forma a mapear os requisitos necessários. O segundo passo é a contratação de empresa terceirizada de forma a montar o módulo básico com capacidade de ser expandido em suas funcionalidades por módulos acopláveis, capazes de serem instalados e desinstalados. O terceiro momento é o desenvolvimento de módulos específicos, documentação. O treinamento surge em seguida, é feito em duas etapas, com algumas entidades para avaliarem o software, incluídos os técnicos da Prefeitura Municipal de São Carlos, para que estes possam reproduzir o treinamento em um segundo momento com outras entidades. Passado essa quarta etapa, o treinamento é com todas as entidades voltadas à criança e o adolescente. A dificuldade da distância entre as entidades será vencida com integração das mesmas ao projeto da Prefeitura de criar uma rede sem-fio interligando toda a cidade de São Carlos, protegendo os dados e diminuindo a exposição do tráfego pela internet. Este projeto tem caminhado e mesmo em caso de grave pane poder-se-ia contar com acessos através de speedy/modem associados aos métodos de criptografia SSL.

Vários pontos podem ser considerados fatores de inovação no projeto ReCriAd. Dentre eles estão elencados alguns que seguem:

1) Unificação em um único sistema de entidades distintas. Sempre que pensamos em sistema integrado, tradicionalmente falamos de integrar diversos setores de uma mesma organização. Com o surgimento da internet e a migração das plataformas cliente-servidor para ambientes web com sistemas que utilizam de browsers para a sua operação, esta realidade fez com que as fronteiras da rede interna da organização deixassem de ser fronteiras para a utilização de sistemas informatizados. Dessa forma a possibilidade de integrarmos sistemas de entidades distintas se tornou realidade. Sabidamente, cada entidade que compõe a rede tem a sua autonomia de cadastros dos jovens bem como autonomia para o registro das informações que julgam pertinentes. Um acordo firmado entre a Secretaria Especial de Infância e Juventude e as entidades que fazem parte do projeto ReCriAd consolidou essa integração. A autonomia de cada entidade é mantida e serão selecionadas as permissões de acesso ao cadastro e demais transações somente a parte que cabe a cada entidade.

2) Possibilidade de extração de dados consolidados e espacializados em uma base de dados única sobre ações do poder público e demais entidades. Atualmente se um jovem é atendido por mais de uma entidade que compõe a rede, essa informação é perdida, pois cada uma mantém um registro distinto. Assim se o jovem faz parte de dois programas que se sobrepõe, é muito mais interessante utilizar o recurso com outro jovem que não é atendido por nenhuma entidade, atingindo um maior número de jovens atendidos. Com um sistema consolidado com informações sobre os atendimentos georreferenciadas, o município consegue identificar as regiões que tem maior carência de atendimentos e focar melhor as suas ações.

3) Consórcio entre municípios para o desenvolvimento único de uma solução de Software. Apesar de municípios apresentarem necessidades de software bastante semelhantes, é pouco comum, ou ainda inédito a associação de municípios para o desenvolvimento de soluções compartilhadas. O modelo que é a regra até então é que cada município procure um fornecedor de solução para cada necessidade que apresenta. O recuso público gasto com aquisição de licenças de software ou mesmo desenvolvimentos paralelos torna-se desnecessário. O compartilhamento de soluções com pequenas adaptações necessárias pode ser uma medida extremamente viável para a informatização do setor público.

4) Possuir um órgão financiador como mediador para a união de diversos municípios. A iniciativa da Fundação Telefônica de identificar que os municípios fizeram projetos e demandas de sistemas bastante semelhantes e propor um único desenvolvimento coletivo é bastante inovadora. O fato de o órgão financiador promover essa integração extrapola as barreiras políticas que possam intervir em situações semelhantes.

5) Confecção de um Software livre na área da proteção dos direitos da criança e Adolescente. Participar e desenvolver um Software Livre é sempre um prazer adicional aos entusiastas do assunto. Quando este tem uma finalidade tão nobre quanto ao projeto ReCriAd, o entusiasmo é potencializado. São Carlos que há tempos defende a utilização de Softwares Livres, de código aberto, teve um papel decisivo na Fundação Telefônica e no BNDES, pois alertou-os sobre os benefícios de se financiar projetos cujo produto final seja um SL. Essas instituições passaram então a utilizarem como regra o financiamento de Softwares Livres para esses tipos de projetos.

Quanto ao público alvo do projeto, identificamos dois nichos fundamentais, o primeiro, que são diretamente beneficiados são as crianças e adolescentes atendidos por programas sociais, sejam elas por organismos governamentais ou não. O segundo público beneficiado diretamente são aqueles que, mesmo necessitando de atenção, não são atendidos por programas sociais e passarão ser, uma vez que o sistema possibilita uma maior percepção da realidade e permite com que ações tenham um foco mais específico.

Indiretamente toda a sociedade passa a ser beneficiária do projeto, pois este colabora com a redução da criminalidade, principalmente no que tange a reincidência (projeto NAI).

Quando falamos em redução de maioridade penal, certamente o fazemos, pois não aplicamos o Estatuto da Criança e Adolescente – ECA em sua totalidade. A experiência do NAI em São Carlos que concentra vários órgãos que trabalham no atendimento do adolescente infrator, principalmente com medidas sócio-educativas de liberdade assistida ou de meio aberto, é a prova disso. Os resultados foram a redução da maior parte dos índices envolvendo a criminalidade entre adolescentes. Entre 2001 e 2006 o número de internações caiu 80% e o índice de reincidência ficou, em média, em 4%. O NAI, inaugurado em 16 de março de 2001, foi concebido visando a agilização com eficiência dos procedimentos afetos à apuração de atos infracionais imputados a adolescentes, desde o momento da apreensão policial até a determinação da sentença de aplicação da medida sócio educativa.

Certamente quando o projeto estiver em funcionamento, os benefícios para as entidades que lidam com as crianças e adolescentes serão extremamente perceptíveis, uma vez que uma rede sempre possibilita maior facilidade de comunicação, diminuição de trabalho extra, inteligência, poder de associação, entre outros. O projeto encontra-se na fase final de seu desenvolvimento, coincidentemente quando toda a sociedade volta seus olhos à situação do menor infrator.

Pelo fato do ReCriAd integrar diversos setores da administração como saúde, educação, cultura, assistência social, esportes e lazer temos uma grande possibilidade da transversalidade entre projetos de secretarias distintas e demais entidades assistenciais não governamentais que irão nortear suas ações pelo sistema.

O ReCriAd é um grande aliado do ECA na real aplicação dos direitos da criança e do adolescente.

Tecnicamente para a implantação do projeto ReCriAd foram necessários recursos de várias fontes, sejam eles humanos ou financeiros. O Departamento de Logística e Tecnologia da Informação da Prefeitura de São Carlos realizou todo o mapeamento dos requisitos de software das diversas entidades e desenhou a arquitetura básica do sistema. Os apoios do BNDES e da Fundação Telefônica, tanto financeiro quanto técnico, também viabilizaram o projeto. Quanto ao apoio às entidades assistenciais que compõe a rede, cada uma delas receberá um micro-computador com impressora, e farão parte da rede MAN (Metropolitan Area Network – Rede de Área Metropolitana) que a Prefeitura de São Carlos está implantando. Nas alíneas do projeto, existem recursos para que cada entidade possa se conectar à infra-estrutura criada pelo município.

Todos os subsídios necessários à criação e implantação da rede estão postos. Uma vez que o sistema esteja em utilização e passe a fazer parte do dia-a-dia das entidades torna-se praticamente impossível retroceder, ou seja, caso entre algum governo municipal que queira descontinuar o projeto, este sentirá uma enorme resistência de todas as entidades que se beneficiam do projeto.

Os indicadores que medirão o grau de sucesso são diversos. Entre eles encontramos o IDI – Índice de Desenvolvimento Infantil, publicado pelo UNICEF varia de 0 a 1 e é calculado a partir dos seguintes indicadores: escolaridade dos pais, matrículas de crianças de 4 a 6 anos em unidades de educação infantil e acesso a serviços de saúde (pré-natal e vacinação). Quanto mais perto do 1, maiores as chances de sobrevivência e desenvolvimento na primeira infância. Também são indicadores as taxas de criminalidades de menores bem como as taxas de reincidência.

O desenvolvimento do software teve inicio em meados de 2006 com a proposição da Fundação Telefônica de formar o consórcio entre os municípios. Está prevista a conclusão da implementação do projeto para agosto de 2007. Desse ponto em diante serão feitos os treinamentos das entidades, as customizações, testes finais e correções necessárias.

Como o projeto de software será publicado sob a licença GPL (General Public Licence - Licença Pública Geral), qualquer outro município que tenha interesse em utilizar o sistema poderá faze-lo sem custo algum. O acesso ao código fonte permite com que qualquer um possa adaptá-lo as suas necessidades e se for o caso até disponibilizar as melhorias feitas para que outros possam usufruí-las. Todos os softwares que utilizam nos servidores também são baseados em Software Livre, fato que torna a reprodução do modelo aplicado em São Carlos e demais municípios do consórcio extremamente fácil. A linguagem de desenvolvimento (PHP) é de domínio de muitos programadores, o que faz com que o município que queira utilizar o sistema possa contratar mão-de-obra local para a sua implantação e customização.

Para o nível estratégico, a tecnologia de melhor flexibilidade é através da WEB, optando-se pelo software Apache com a linguagem PHP, rodando sob o sistema operacional linux. O SGBD escolhido é o PostgreSQL. A demanda estimada em termos de processamento é um servidor dual processado com processadores Xeon 5110, com HD de tecnologia SAS, enquanto em cada entidade participante receberá um computador apto à conexão com a internet com linux no desktop. O software produzido será liberado sob a licença GPL, facilitando a criação de uma comunidade desenvolvedora, beneficiando o maior número de municípios possíveis.

Autores do Trabalho: Ronaldo César Serafini Abrão e Carlos Costa Jordão

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